sexta-feira, 13 de junho de 2014

Um Passado Sem Condenações – Parte 2


Era o ano de 1986, eu com 25 anos, estava vivendo a melhor fase da vida, até então! Morava no Recife, em plena praia de Boa Viagem, de frente para o mar! Era Encarregado de Padaria e gerenciava 15 pessoas. Trabalhava há alguns quarteirões de casa. Na hora do almoço, até dava pra dar uns mergulhos na praia. Me sentia importante e feliz!
Num belo dia, vislumbrei a beleza de um pernambucano, passeando pelo centro da cidade. Seu sorriso me cativou e a atração foi imediata. Naquele tempo eu acreditava em amor à primeira vista! Logo estávamos morando juntos e em pouco tempo, o que parecia ser um sonho encantado virou pesadelo! O cara se mostrava extremamente ciumento até mesmo com a sombra. Eu protelava, pois acreditava se tratar de amor, até o dia em que ele me encontrou na praia conversando com um amigo e o agrediu!
Começou a me privar da companhia dos meus amigos e estabeleceu horários para eu ficar dentro de casa. Chegou ao cumulo de colocar o porteiro do prédio me vigiando! Minha vida passou a ser páginas de cadernetas. A gota d’agua aconteceu, quando ele ficou sabendo que eu havia passado a tarde, bebendo cerveja com um amigo! Chegou em casa, pegou uma faca e começou a me ameaçar, dizendo coisas horríveis. Me desvencilhei, abri a porta e saí correndo escadaria abaixo. Ele no meu encalço querendo me matar! Eu gritava desesperado para os vizinhos abrirem as portas, até que uma senhorinha me deu guarida! Entrei me escondi até o dia seguinte! Esperei ele sair, arrombei a porta, peguei minhas coisas, pedi demissão do trabalho e voltei pra São Paulo! Humilhado fui pedir ajuda à minha mãe, que me aceitou de braços abertos! Depois de tantos anos distantes um do outro, nossa reaproximação foi difícil, nossos diálogos sempre foram truncados, nervosos, agitados. Discutíamos principalmente porque ela nem queria argumentar sobre minha sexualidade. Não aceitava e pronto! Era um tabu, falar sobre isso! Consegui emprego no Banco Itaú e aceitei convite de minha “tia Madá” para frequentar um grupo de atletas; ela sabia que que adorava jogar bola! Encontrei um grupo de pessoas alegres, felizes, bonitas e abastados! Quer recepção melhor? Uma vez por semana sempre havia alguma atividade! Nem imaginava que aquelas reuniões, se transformariam em grupos de debates cada vez mais envolventes! Era o “Atletas de Cristo”, grupo que ficou famoso nos anos 80, pela forma descontraída e pela linguagem informal e familiar; reunia atletas de várias modalidades, classes sociais e grupos étnicos. Conheci o Muller, o Silas, o Alex Dias Ribeiro entre outros atletas famosos! Aceitei fazer parte do grupo e frequentei a Igreja Batista do Morumbi, uma igreja de ricos! Agora, imaginem, como um pobre coitado como eu, que morava na Vila Nova Cachoeirinha (Zona Norte) poderia fazer parte daquele grupo? Só DEUS mesmo!
Essa lua de mel durou alguns anos, nesse período experimentei ideais elevados, inseridos no meu contexto de vida! Na busca de iluminação espiritual e objetivos nobres cristãos, não praticava sexo com ninguém e raramente me masturbava! Quando isso acontecia batia arrependimento! Até minha mãe deu trégua e passou a acreditar na transformação que havia acontecido dentro de mim! Mergulhei de cabeça no “protestantismo”, fiz teologia, descobri os segredos por trás dos púlpitos, conheci pessoas incríveis, com boas intenções me auxiliando em tudo! Até que comecei a namorar uma garota, da mesma idade e um conflito brotou na minha cabeça. Naquela época estávamos nos preparando para sermos missionários entre os “muçulmanos” e teríamos que oficiar o casamento antes de ir pra linha de frente. Daí eu pensei: como vou casar com uma mulher sem conhece-la sexualmente? Eu ainda sentia atração por homens, mas conseguia controlar. Dúvida cruel! Então quando sugeri que fizéssemos sexo, ela achou um absurdo! Não deu outra, desisti de tudo e de todos. Me senti aliviado, tirei um peso da minha consciência!

Nesse período fui surpreendido com o diagnóstico de Câncer de Colo do Útero em minha mãe. Desde o começo ela soube do que se tratava e iniciou o tratamento cedo, fez os procedimentos para impedir o avanço da doença. Fiquei ao seu lado em todo instante! Mas como sempre tivemos dificuldades de diálogo, não falávamos sobre a doença, ela sofria com fortes dores e muitas vezes tinha que leva-la ao serviço de emergência. Nos apegamos à religião na tentativa de aliviar o peso da situação! Mesmo assim minha mãe não era uma pessoa otimista e deixou se abater. Em pouco tempo o câncer se espalhou para outros órgãos e na impossibilidade de tratamento em casa, tive que coloca-la em um hospital para receber suporte e medicamentos necessários, mesmo contra sua vontade. Ela ficou com raiva de mim e não falava comigo, quando ia visita-la diariamente. Lembro que aquela situação toda me deixava extremamente mal e só conseguia forças em DEUS! Foram dias terríveis! Eu ficava horas vagando pelas ruas na busca de respostas. Até o fatídico dia em que recebi a notícia do seu falecimento. Saí desesperado até o hospital, quando lá cheguei me levaram para ver seu corpo, uma imagem aterradora nunca saiu da minha cabeça: ela deitada com os olhos abertos e uma expressão de medo e solidão latente em seus olhos.
Cena de uma morte sofrida. Aquilo me destruiu! Xinguei as enfermeiras por deixa-la daquele jeito! Um abismo se abriu sob meu chão. Me revoltei e culpei DEUS por anos. Me joguei no mundo sem eira nem direção, vivia anestesiado, procurava não pensar. Me drogava. Fazia sexo sem nenhuma prevenção. Estava me punindo pela culpa de não ter sido o filho ideal; de não ter conseguido falar o que um filho deve falar para sua mãe; por nunca ter nos abraçado e beijado ou expressado carinho; por deixa-la morrer sozinha! 
Precisei de anos de terapia e libertação para conseguir superar tudo isso. Pela graça e misericórdia do “Nosso Paizão Celestial” que nunca me abandonou, obtive a redenção! 
Hoje não existem sequelas e toda as cicatrizes foram curadas! Sobre isso eu falarei em uma próxima oportunidade. 
Aguardem cenas dos próximos capítulos!

domingo, 8 de junho de 2014

A Morte Não é Nada!!!


Eu somente passei para o outro lado do Caminho. Eu sou eu, vocês são vocês.
O que eu era para vocês, eu continuarei sendo. Me deem o nome que vocês sempre me deram,
Falem comigo como vocês sempre fizeram. Vocês continuam vivendo no mundo das criaturas,
Eu estou vivendo no mundo do Criador. Não utilizem um tom solene ou triste,
Continuem a rir daquilo que nos fazia rir juntos. Rezem, sorriam, pensem em mim. Rezem por mim.
Que meu nome seja pronunciado como sempre foi, sem ênfase de nenhum tipo.
Sem nenhum traço de sombra ou tristeza. A vida significa tudo o que ela sempre significou, o fio não foi cortado.
Porque eu estaria fora de seus pensamentos, agora que estou apenas fora de suas vistas?
Eu não estou longe, apenas estou do outro lado do Caminho...
Vocês que aí ficaram, sigam em frente, a vida continua, linda e bela como sempre foi....

(Agostinho, 400 DC)


Alguns de vocês ficaram sabendo que eu perdi um grande amigo gaúcho, covardemente assassinado pelo próprio companheiro, há duas semanas atrás. Na mesma semana a mãe de outro grande amigo mineiro, faleceu de repente! E pra completar tomamos conhecimento que a vó de outro grande amigo também havia falecido, vitimada de doença! Antes deles, em 2007, meu tio Valdeto foi vencido pelo alcoolismo! Ninguém está preparado para receber a notícia da morte de uma pessoa querida. Imaginem recebe-la em dose tripla e na mesma semana. Punk total! Daí eu, no meu luto, involuntariamente fui levado a pensar na morte e como ela entrou na minha vida. Recordo-me dos meus 11 anos, eu tinha uma prima que era um ano mais nova. Lembro-me de nossas brincadeiras e que éramos como irmãos. Repentinamente ficamos sabendo que ela tinha um problema no coração e logo veio a falecer. Eu não conseguia compreender como aquilo era possível. Foi uma tristeza geral! Três anos depois; meu único irmão, morreu num acidente de transito! Outro baque, principalmente para minha mãe, que sofreu muito e eu acompanhei de perto. Anos depois, já morando na Bahia, recebi a triste notícia de que meu tio Airton, havia falecido, debilitado pelo vício da bebida! No final dos anos 80, um grande amigo se foi vítima da AIDS. Mas o pior ainda estava por vir. Quando minha mãe foi diagnosticada com câncer, fizemos todos os tratamentos possíveis, não adiantou; ela se entregou, ficou deprimida e logo a morte lhe sugou...literalmente! Algo morreu dentro de mim, junto com ela! Fiquei anos sofrendo, com sua última imagem, cheia de dores e sofrimento! Três anos depois, foi a vez de minha querida Vovó. No entanto desta vez, tudo foi diferente! Minha vó estava com idade avançada e um pouco senil. As melhores lembranças que eu tenho dela, estão bem fortes dentro de mim! Conversávamos sobre coisas do passado, ela me contava seus segredos e os da nossa família. Eu ouvia fascinado! Ela adorava quando eu cortava suas unhas, algo que ninguém fazia! Tínhamos uma cumplicidade; logo eu que cheguei a ser a ovelha negra da família! Agora, era considerado o melhor neto! Até orava com ela! Estava por perto quando ela tranquilamente fez sua passagem, tinha a mesma expressão calma e serena. Também recentemente passei uma das experiência muito dolorosa, com a morte prematura do meu jovem primo William, com apenas 24 anos. Cheio de saúde, num certo dia sem nenhuma explicação passou mal, levado ao hospital, foi diagnosticado com pneumonia. Dias depois entrou em coma onde passou 32 dias vindo a falecer. Foi triste demais ver um jovem partir de forma tão inexplicável, um duro golpe para minha tia perder seu amado filho. Graças a Deus, religiosa como ela é teve o conforto de acreditar que Ele o levou porque precisava dele lá no céu. Mas a experiência que me redimiu em relação à morte, foi a do pai de uma grande amiga. Homem letrado, culto, graduado, professor de português do renovado Colégio Sion, em São Paulo. Ele tinha câncer no intestino e estava desenganado pelos médicos. Não queria ninguém por perto, mas precisava de acompanhamento 24 horas por dia. Então, quando nos conhecemos, aceitou que eu ficasse ao seu lado. Cuidei dele por dois meses, dava remédios, alimentação, banho, limpava sua colostomia e o mais incrível, tínhamos papos divertidos sobre acontecimentos gerais, mas nunca sobre a morte! Ficava impressionado com sua tranquilidade diante da iminência da finitude de sua vida! Ele sabia que iria morrer, mas isso não o abatia! Quando ele piorou e a emergência veio busca-lo, eu o acompanhei nos seus últimos instantes nesse plano! Estava sedado o tempo todo, passei a noite com ele. Logo de manhã bem cedinho, fazia um friozinho, quando olhei para ele, senti que estava partindo. Ajoelhei-me e orei para que os anjos recebessem sua alma e então uma lágrima solitária, rolou em sua face de forma doce e suave! Entendi então que a nossa vida é singela e a linha que a separa é sutil e tênue!

“Quando eu pensar que aprendi a viver, terei aprendido a morrer.” Leonardo da Vinci (1452-1519)